5. Convites
Colegial. Não era mais o purgatório, agora era o inferno puro. Tormento e fogo… sim, eu tinha os dois.
Eu estava fazendo a coisa certa agora. Todos os pingos nos i’s e os traços nos t’s. Ninguém podia reclamar que eu estava evitando minhas responsabilidades agora.
Para deixar Esme feliz e proteger os outros, eu fiquei em Forks. Retornei para meu horário antigo. Cacei mais que o resto deles. Todo dia, eu ia para a escola e fingia ser humano. Todo dia, eu escutava cuidadosamente qualquer coisa nova sobre os Cullens – não tinha nada novo. A garota não tinha falado uma palavra de suas suspeitas. Ela só repetiu a história de novo e de novo – que eu estava ao lado dela e a tinha tirado do caminho – até que os ouvintes ficaram entediados e pararam de pedir mais detalhes. Não havia perigo. Minha ação precipitada não tinha machucado ninguém.
Ninguém além de mim.
Estava determinado a mudar o futuro. Não era a coisa mais fácil de se fazer, mas não tinha outra escolha com a qual eu podia viver.
Eu tinha pensado que aquele primeiro dia tinha sido o mais difícil. No final dele, eu tinha certeza que esse era o caso. Mas estava errado.
Estava amargurado, sabendo que tinha machucado a menina. Tirei conforto do fato de que a dor dela não era nada mais do que uma picada – só uma pequena ferroada de rejeição – comparada com a minha. Bella era humana, e ela sabia que eu era algo mais, algo errado, algo assustador. Ela provavelmente se sentiria mais aliviada do que magoada quando eu virasse meu rosto para longe dela e fingisse que ela não existe.
– Oi, Edward,- ela me cumprimentou no meu primeiro dia de volta a classe de biologia. A voz dela estava agradável, amigável, 180 decibéis desde a ultima vez que eu falei com ela.
Por quê? O que a mudança queria dizer? Ela teria esquecido? Decidiu que ela imaginou todo o episodio? Ela poderia possivelmente ter me perdoado por não cumprir minha própria promessa?
As perguntas estavam queimando como a sede que me atacava toda vez que eu respirava.
Apenas por um instante eu olhei nos olhos dela. Só para ver se eu podia encontrar respostas lá…
Não. Eu não podia me permitir nem mesmo isso. Não se eu fosse mudar o futuro.
Eu movi meu queixo devagar na direção dela sem olhar para longe da frente da sala. Eu acenei com a cabeça uma vez, e então eu virei meu rosto para frente…
Ela não falou comigo de novo.
Aquela tarde, assim que a escola terminou, meu papel também terminou, eu fui até Seattle como eu tinha feito um dia antes. Parecia que eu poderia agüentar a dor apenas levemente melhor quando eu estava voando ao longo do chão, transformando tudo a minha volta em um borrão verde.
Essa corrida se tornou meu habito diário.
Eu a amava? Eu não acho que era isso. Não ainda. A visão de Alice do futuro que eu tinha preso comigo, embora, eu pudesse ver quão fácil seria me apaixonar por Bella. Isso seria exatamente como cair: Sem esforço. Não deixar de amá-la seria o oposto da queda – como ser puxado de um penhasco, eu apoiei meu rosto sobre a mão, a tarefa foi cansativa, como se eu já não tivesse força mortal.
Mais de um mês se passou, e cada dia era mais difícil. Isso não fazia sentido para mim – me manter perto dela, para que as coisas fossem mais fáceis. Devia significar isso quando Alice disse que eu não desejaria, e não conseguiria ficar longe da menina. Ela tinha visto a escalada da dor. Mas eu podia lidar com a dor.
Eu não iria destruir o futuro da Bella. Se eu fosse destinado ao amor dela, e então ela não fosse evitar, esse era o mínimo que eu podia fazer?
Evitar ela era o máximo que eu podia agüentar; entretanto. Eu podia fingir ignorá-la, e nunca estar em seu caminho. Eu podia fingir que ela não me interessava. Mas se essa era medida, eu apenas faria de conta, e não seria real.
Eu ainda flutuava a cada respiração dela, cada palavra que ela dizia.
Eu aglomerava meus tormentos em quatro categorias.
Os dois primeiros eram familiares. O seu aroma e o seu silêncio. Ou, ao invés – assumir a responsabilidade por mim mesmo ao que ela pertencia – a minha sede era minha curiosidade.
A sede era o meu primeiro tormento. Eu tornei um hábito, agora, simplesmente não respirar na aula de Biologia. Mas é claro, sempre há exceções – quando eu tinha de responder a uma pergunta ou algo do tipo, e eu teria necessidade de falar usando meu fôlego. Cada vez que eu saboreasse o ar em torno da garota, que era o mesmo desde o primeiro dia – fogo e violência brutal e a necessidade desesperada de me livrar. Era mesmo um pouco difícil de agarrar a razão ou retenção nesses momentos. E, como no primeiro dia, o monstro estava prestes a rugir, tão perto da superfície…
A curiosidade era um dos meus constantes tormentos. Uma coisa que nunca saiu da minha cabeça: O que ela está pensando agora? Ao ouvi-la calmamente suspirar. Quando ela passava um dos dedos sobre o cabelo. Quando ela jogava o livro com mais força do que o normal. Quando ela chegava na aula tarde. Quando ela batia seu pé, impaciente, sobre o chão. Cada movimento que eu pegava na minha visão periférica era um irritante mistério. Quando ela conversava com os outros alunos humanos, eu analisava todas as palavras e seu tom. Será que ela dizia o que estava pensando, ou ela pensava no que iria dizer? Se isso soava para mim como se ela estivesse tentando dizer o que a sua audiência esperava, e isso me fez lembrar da minha família e de nossa vida diária da ilusão – nos éramos melhores do que ela estava sendo. Ao menos eu estava errado sobre isso, apenas imaginando coisas. Por que ela iria ter um papel a desempenhar? Ela era um deles – uma jovem adolescente.
Mike Newton era o mais surpreendente dos meus tormentos. Quem teria sonhado que um tão comum e entediante mortal poderia ser tão irritante? Para ser justo, eu deveria ter de sentir gratidão pelo entediante garoto; mais do que os outros, ele fazia a garota falar. Eu aprendi muito sobre ela através dessas conversas – eu ainda montava a minha lista -, mas contrariamente, a assistência de Mike com este projeto só me deixava mais irritado.
Eu não queria que Mike fosse o único a descobrir segredos. Eu queria fazer isso.
Ele nunca percebeu as pequenas revelações que ela fazia, seus pequenos discúidos.
Ele não sabia nada sobre ela. Ele criou uma Bella em sua cabeça, que não existia – uma menina tão comum como ele era. Ele não tinha observado a generosidade e bravura que a distingüia dos outros humanos, ele não conhecia a anormal maturidade das suas falas. Ele não percebia que, quando ela falava de sua mãe, ele falava de sua mãe como se ela fosse uma criança e não o contrário – amorosa, indulgente, um pouco divertida, e ferozmente protetora.
Ele não percebia a paciência em sua voz quando ela fingia interesse no caminho das conversas, e não adivinhava o que havia atrás de sua paciente bondade.
Embora nas conversas com Mike, eu fosse capaz de adicionar a qualidade mais importante para a minha lista, e mais reveladora de todas elas, tão simples como rara. Bella era boa. Todas as outras coisas somadas com tudo – agradável, discreta, altruísta, amorosa e corajosa – ela era cada vez melhor através do tempo.
Não me tornavam mais gentil com o garoto, no entanto. A maneira como ele ficava possessivo quando via a Bella – como se ela fosse feita para ele – me provocou quase raiva com o seu rude fantasiar sobre ela. Ele estava se tornando mais confiante de si mesmo, também, quando o tempo passou, ele considerou isso ao vê-la preferi-lo aos seus rivais – Tyler Crowley, Erick Yorkie, e sempre, esporadicamente, eu mesmo. Ele se sentava rotineiramente ao seu lado na mesa, conversando com ela, encorajado por seus sorrisos. Apenas educados sorrisos, eu disse a mim mesmo. Eu freqüentemente me pegava imaginando, entretido, rebatendo ele contra a parede da sala… É muito provável que ele não fosse se ferir fatalmente…
Mike muitas das vezes não pensava em mim como um rival. Após o acidente, ele ficou preocupado que Bella e eu fossemos criar vínculos a partir da experiência partilhada, mas obviamente teve o resultado oposto. Naquela época, ele ainda tinha ficado irritado que eu e Bella tínhamos deixado o seu grupo de atenções. Mas agora eu o ignorei perfeitamente como os outros, e ele progrediu complacente.
O que ela estava pensando agora? Será que ela gostava de ser o centro das atenções?
E, finalmente o último dos meus tormentos, o mais doloroso: A indiferença de Bella. Como eu havia ignorado ela, ela me ignorou também. Ela nunca tentou falar comigo novamente. Com tudo que eu sabia, ela nunca pensou em mim novamente.
Isso poderia me levar a loucura- ou até mesmo mudar minha decisão para alterar o futuro – exceto que ela às vezes me encarava como ela havia feito antes. Eu não a via para mim, como se eu não pudesse me permitir olhar para ela, mas Alice sempre nos advertia quando ela estava prestes a me encarar; Os outros estavam sendo cuidadosos com o conhecimento problemático da garota.
Aliviava um pouco a dor quando ela me olhava de longe de vez em quando. É claro que ela poderia estar imaginando que tipo de louco que eu era.
“Bella vai encarar Edward em um minuto. Pareça normal.” Alice disse uma terça-feira de Março, e os outros tomaram cuidado para gesticular e se mexer como um humano; ficar totalmente parado era um hábito da nossa espécie.
Eu prestei atenção para quantas vezes ela olhava na minha direção. Me agradava, apesar de não dever agradar, que a freqüência não diminuía conforme o tempo passava. Eu não sabia o que aquilo significava, mas me fazia me sentir melhor.
Alice suspirou. “Eu gostaria…”
“Fique fora disso, Alice,” Eu disse por baixo do fôlego. “Não vai acontecer”
Ela fez um bico. Alice estava ansiosa para formar sua amizade iminente com Bella. De uma forma estranha ela sentia falta da garota que ela nem conhecia.
“Eu admito que você é melhor do que eu pensei. Você tem seu futuro todo determinado e sem sentido de novo. Espero que você esteja feliz” Ela pensou.
“Faz bastante sentido pra mim.”
Ela fez um som impaciente de forma delicada.
Eu tentei a ignorar, estava muito impaciente para conversas. Eu não estava de bom-humor- mais tenso do que eu deixava qualquer um deles ver. Só Jasper sabia como eu estava, sentindo o stress ao meu redor com sua habilidade única de sentir e influenciar o humor das pessoas ao redor. Ele não entendia as razões por trás dos humores e – como seu estava constantemente em um humor ruim- ele ignorava.
Hoje seria um dia difícil. Mais difícil que o dia anterior, esse era o padrão.
Mike Newton, o garoto odiável com quem eu não podia me permitir virar rival, ia chamar Bella para um encontro.
O baile que as garotas escolhiam o par estava chegando, e ele esperava muito que Bella o chamasse. E que ela não havia feito nada que abalava a confiança dele. Agora ele estava desconfortavelmente preso – eu gostava do desconforto dele mais do que eu devia – porque Jessica Stanley tinha acabado de o chamar. Ele não queria dizer “sim”, esperando que Bella o escolhesse (e provar que ele era o vitorioso entre seus rivais), mas ele não queria dizer “não” e acabar perdendo o baile. Jessica, magoada pela sua hesitação e imaginando a razão por trás disso, estava tendo pensamentos raivosos contra Bella. Eu entendi o instinto melhor agora, mas só me fez mais frustrado quando eu não podia agir.
E pensar que tinha chegado a esse ponto! Eu estava totalmente fixado nos dramas da escola que um dia eu havia simplesmente ignorado.
Mike estava trabalhando na sua coragem conforme ele andava com Bella até a aula de biologia. Eu ouvi sua luta interna enquanto eu esperava eles chegarem. O garoto era fraco. Ele tinha esperado por essa festa de propósito, com medo de fazer seu afeto reconhecido antes dela ter mostrado uma preferência por ele. Ele não queria ficar vulnerável para uma possível rejeição, preferindo que ela desse aquele passo antes.
Covarde.
Ele sentou do nosso lado de novo, confortável com a familiaridade, e eu imaginei o som que seu corpo faria se batesse contra a parede oposta com força suficiente para quebrar a maioria dos seus ossos.
– Então – ele disse pra garota, seus olhos no chão. – Jessica me chamou para o baile de primavera.
– Isso é ótimo. – Bella respondeu imediatamente e com entusiasmo. Era difícil não sorrir conforme Mike se dava conta de seu tom. Ele estava esperando por consternação. – Você vai se divertir muito com a Jessica.
Ele refletiu sobre a resposta certa. – Bem… – ele hesitou, e quase desistiu. Então voltou ao trilho. – Eu falei pra ela que ira pensar sobre isso.
“Por que você faria isso?” ela perguntou. O tom dela era mais de desaprovação, mas ainda tinha uma pontada de alívio também.
O que aquilo significava? Uma fúria inesperada fez com que minhas mãos se curvassem nos meus punhos com força.
Mike não ouviu o alívio. O rosto dele vermelho – com a raiva que eu estava parecia um convite – e ele olhou para o chão de novo enquanto falava.
“Eu estava pensando….talvez você estivesse pensando em me chamar.”
Bella hesitou.
Naquele momento de hesitação, eu vi o futuro mais claramente do que Alice.
Ela talvez possa dizer sim para a pergunta implícita de Mike, talvez não, mas ainda assim, algum dia ela diria sim para alguém. Ela era adorável, intrigante e outros homens notavam isso. Se ela fosse se prender a alguém nesse grupo insalubre, ou esperasse para estar livre de Forks, o dia que ela diria sim chegaria.
Eu vi a vida dela como tinha visto no dia anterior – faculdade, carreira…amor, casamento. Eu vi ela de braços dados com seu pai, vestida de branco, seu rosto corado de felicidade conforme ela se movia com a marcha nupcial de Mendelssohn.
A dor era mais forte do que jamais tinha sido. Um humano teria que estar à beira da morte para sentir essa dor- um humano não sobreviveria a isso.
E não só a dor mas o ódio.
A raiva também doía de uma forma física. Mesmo que esse garoto insignificante não seja para quem Bella diga sim; Eu queria esmagar o crânio dele na minha mão, para deixar ele representar quem ela escolher.
Eu não entendia essa emoção – era uma mistura de dor e raiva e desejo e desespero. Eu nunca havia me sentido assim antes; não podia definir isso.
“Mike, acho que você devia dizer sim,” Bella disse de forma gentil.
As esperanças de Mike desapareceram. Em outras circunstâncias eu teria gostado mas eu estava preso no choque após a dor – e o remorso que a dor e a raiva tinham me dado.
Alice estava certa. Eu não era forte o suficiente.
Agora, Alice estaria vendo o futuro contorcido e revirando, ficando confuso de novo. Isso a agradaria?
“Você já chamou alguém?” Mike perguntou sóbrio. Ele deu uma olhada para mim, suspeitando pela primeira vez em um bom tempo. Eu notei que nunca tinha disfarçado meu interesse bem, minha cabeça estava inclinada na direção de Bella.
A raiva descontrolada nos pensamentos dele – raiva por qualquer um que ela preferisse – de repente deu um nome ao meu sentimento.
Eu estava com ciúmes.
“Não” Ela disse achando um pouco de graça. “Eu não vou mesmo.”
Por trás de todo o remorso e raiva, eu senti alívio nas palavras dela. De repente eu estava considerando os meus rivais.
“Por que não?” Mike perguntou de uma forma quase mal-educada. Me ofendia que ele falasse assim com ela. Eu me segurei.
“Eu vou para Seattle nesse sábado.” Ela respondeu.
A curiosidade não era mais tão viciante quanto antes – agora que eu estava mais concentrado em descobrir as respostas e tudo mais. Eu saberia os porquês e quando dessa revelação.
O tom de Mike continuou grosso. “Você não pode ir outro dia?”
“Desculpa, não.” Bella foi mais brusca agora. “Então você não deveria fazer Jess esperar mais – È falta de educação.”
A preocupação dela com os sentimentos de Jessica diminuiu as chamas do meu ciúme. Essa viagem para Seattle me parecia suspeita como uma desculpa para dizer não – ela recusou puramente por lealdade a amiga? Ela realmente queria poder dizer sim? Ou os dois palpites estavam errados? Ela estava interessada em outra pessoa?
“…, você tem razão.” Mike murmurou, com a moral tão baixa que eu quase senti pena dele. Quase.
Ele parou de olhar para ela, cortando minha visão do rosto dela na sua mente.
Eu não podia tolerar isso.
Eu virei para ler a expressão dela por mim mesmo, pela primeira vez em mais de um mês. Foi um alívio poder me autorizar a fazer isso, como respirar depois de muito tempo embaixo d’água era para humanos.
Os olhos delas estavam fechados e suas mãos de cada lado do seu rosto. Seus ombros curvados pra frente de forma defensiva. Ela balançava a cabeça suavemente, como se ela estivesse tentando parar de pensar em alguma coisa.
Frustrante. Fascinante.
A voz do Sr.Banner a tirou da sua reflexão e seus olhos abriram devagar. Ela olhou para mim imediatamente, talvez sentindo que eu a olhava. Ela me olhou nos olhos com a mesma expressão perplexa que tinha me perseguido.
Eu não senti remorso ou culpa ou raiva naquele segundo. Eu sabia que eles reapareceriam, logo mas por hora era até um pouco excitante. Como se eu tivesse ganhado e não perdido.
Ela não parou de me olhar mesmo eu encarando-a com uma intensidade imprópria, tentando sem sucesso ler seus pensamentos por seus olhos castanhos. Eles estavam cheios de perguntas ao invés de respostas.
Eu podia ver a reflexão dos meus próprios olhos, vi eles pretos com sede. Já haviam passado quase duas semanas desde a última vez que eu cacei; isso não era o modo mais seguro de sucumbir a minha vontade. Mas a escuridão não pareceu assustar ela. Ela não olhou em outra direção e uma leve cor vermelha começou a aparecer na sua face.
O que ela estava pensando agora?
Eu quase perguntei em voz alta, mas quase ao mesmo momento Sr.Banner chamou meu nome. Eu ouvi a resposta certa na sua mente e olhei rapidamente na sua direção.
Eu respirei rapidamente. “Ciclo de Krebs.”
A sede coçou minha garganta – fazendo meus músculos mais tensos e enchendo minha boca com veneno. – eu fechei os olhos, tentando me concentrar apesar do desejo pelo sangue dela que pulsava dentro de mim.
O monstro estava mais forte do que antes. O monstro estava reaparecendo. Ele se juntou a esse futuro que dava a ele uma chance de 50% que ele desejava de maneira cruel.
O terceiro futuro incerto eu havia tentando construir por força de vontade apenas tinha sido destruído – pelo ciúmes, acima de tudo. – e por isso o monstro estava cada vez mais perto de ter seu desejo.
O remorso e a culpa me queimaram assim como a sede e se eu tivesse como produzir lágrimas elas estariam se formando agora.
O que foi que eu fiz?
Sabendo que a batalha estava perdida, não parecia ter mais uma razão para resistir o que eu queria; eu virei para encarar Bella novamente.
Ela havia se escondido no próprio cabelo, mas eu podia ver que seu rosto estava totalmente vermelho agora.
O monstro gostou daquilo.
Ela não me olhou novamente, mas mexeu de forma nervosa em uma mecha de cabelo. Seus dedos delicados, seu pulso delicado – eles eram tão frágeis, parecendo que só minha respiração podia os romper.
Não, não, não. Eu não podia fazer isso. Ela era muito frágil, boa demais, preciosa demais para merecer esse destino. Eu não podia permitir que minha vida colidisse com a dela, destruir a vida dela.
Mas eu não podia ficar longe dela também. Alice estava certa sobre isso.
O monstro dentro de mim se manifestou, frustrado conforme eu pensava.
Minha breve hora passou muito rápido. O sinal tocou e ela começou a arrumar as coisas sem olhar para mim. Isso me decepcionou mas eu não podia esperar nada menos. O jeito que eu tinha a tratado desde o acidente foi inaceitável.
“Bella?” eu disse, sem conseguir me segurar. Minha força de vontade despedaçada.
Ela hesitou antes de olhar pra mim; quando ela virou sua expressão estava defensiva e desconfiada.
Eu relembrei a mim mesmo que ela tinha o direito de desconfiar de mim. Ela devia.
Ela esperou que eu continuasse mas eu só olhei para ela lendo sua expressão. Eu respirava forte em intervalos regulares, lutando contra minha sede.
“O que?” Ela finalmente perguntou. “Você está falando comigo novamente?” Havia um pingo de ressentimento em sua voz, como sua raiva aparecendo. Isso me fez sorrir.
Eu não tinha certeza de como responder a pergunta dela.Eu devia falar com ela de novo?
Não. Não se eu pudesse evitar. Eu tentaria.
“Não, na verdade não.” Eu falei para ela.
Ela fechou os olhos, o que me frustrou. Eu me permiti o máximo para tentar acessar os seus sentimentos. Ela respirou fundo sem abrir os olhos. Seu maxilar estava rígido.
Com olhos fechados, ela falou. Certamente não era o jeito normal de conversar. Porque ela fazia isso?
“Então o que você quer, Edward?”
O som do meu nome nos lábios dela fez algo estranho ao meu corpo. Se meu coração batesse, estaria acelerado.
Mas como responder para ela?
Com a verdade, eu decidi. Seria o mais sincero que eu podia ser com ela a partir de agora. Eu não queria merecer sua desconfiança, mesmo omitir a verdade era impossível.
“Me desculpe.” Eu falei. Era a melhor verdade que ela poderia saber. Infelizmente o único jeito seguro de me desculpar era de maneira trivial. “Eu estou sendo muito mal educado, eu sei. Mas é melhor assim, acredite.”
Seria melhor se eu pudesse continuar sendo mal educado. Será que eu conseguiria?
Os olhos dela abriram, sua expressão ainda cautelosa.
“Não sei o que você quer dizer.”
Eu tentei o máximo que podia por um aviso entrelinhas para ela. “… melhor para nós não sermos amigos.” Certamente ela podia sentir a verdade. Ela era esperta. “Confie em mim.”
Os olhos dela se estreitaram e eu lembrei que eu havia dito as palavras para ela antes – logo antes de quebrar a promessa. Eu me encolhi quando ela travou o queixo – ela claramente lembrava também.
“… uma pena você não ter descoberto isso antes.” Ela disse brava. “Você poderia ter evitado todo esse arrependimento.”
Eu a encarei em choque. O que ela sabia dos meus arrependimentos?
“Arrependimento? Arrependimento pelo que?” Eu exigi.
“Por não ter deixado aquela van idiota me esmagar!” ela respondeu bruscamente.
Eu congelei, entorpecido.
Como ela podia pensar isso? Salvar sua vida tinha sido a única coisa certa que eu fiz desde que a conheci. A única coisa de que não me envergonhava. A única coisa que me deixava feliz em existir. Estive lutando para mantê-la viva desde o primeiro momento em que senti seu cheiro. Como ela podia estar pensando isso de mim? Como se atrevia questionar meu único ato de bondade em toda essa bagunça?
– Acha que me arrependo de ter salvado você?
– Eu sei que se arrepende.
A avaliação dela das minhas intenções me deixou fervendo de raiva. – Você não sabe de nada.
Como sua mente funcionava de um jeito confuso e incompreensível! Ela não devia pensar do mesmo modo que os outros humanos. Essa devia ser a explicação por trás de seu silêncio mental. Ela era completamente diferente.
Ela virou o rosto, batendo os dentes. Suas bochechas estavam vermelhas, com raiva de novo. Ela juntou os livros em uma pilha, os colocou nos braços e marchou na direção da porta sem encontrar meu olhar.
Mesmo irritado como eu estava, era impossível não achar seu ódio divertido.
Ela andou desajeitada, sem olhar para onde ia, e seu pé bateu no batente da porta. Ela tropeçou, e todas as coisas caíram no chão. Ao invés de se curvar para pegá-las, ficou parada, rígida, sem ao menos olhar para baixo, como se não tivesse certeza de que os livros merecessem ser recuperados.
Consegui não dar risada.
Ninguém estava aqui para me ver; eu fui rapidamente para o seu lado e juntei os livros antes que ela olhasse para baixo.
Ela se inclinou, me viu, e parou. Entreguei os livros para ela, tomando cuidado para que minha pele gelada não tocasse a dela.
– Obrigada. – ela disse numa voz fria, severa.
Seu tom trouxe minha irritação à tona.
– Não há de quê. – respondi no mesmo tom frio.
Ela se endireitou e foi para sua próxima aula.
Eu fiquei olhando até que não pudesse mais ver sua figura nervosa.
A aula de espanhol passou em um borrão. A Sra. Goff não questionou minha distração – ela sabia que meu espanhol era superior ao dela, e me deu liberdade – me deixando livre para pensar.
Então, eu não podia ignorar a garota. Isso era óbvio. Mas isso significava que eu não tinha outra saída a não ser destruí-la? Este não podia ser o único futuro disponível. Tinha que ter alguma outra escolha, algum equilíbrio. Tentei pensar em um jeito…
Não prestei muita atenção em Emmett até que a aula terminou. Ele estava curioso – Emmett não era muito intuitivo sobre os sentimentos dos outros, mas ele podia ver uma óbvia mudança em mim. Perguntou-se o que teria acontecido para tirar o insistente olhar de ódio do meu rosto. Ele lutou para definir a mudança, e finalmente decidiu que eu parecia esperançoso.
Esperançoso? Era assim que eu parecia por fora?
Refleti com a idéia de esperança enquanto andávamos para o Volvo, me perguntando sobre o que exatamente eu devia ter esperança.
Mas não tive que refletir por muito tempo. Sensível aos pensamentos dos outros sobre a garota como eu era, o som do nome de Bella nas cabeças dos meus… dos meus rivais, tive que admitir, chamou minha atenção. Eric e Tyler, tendo escutado – com muita satisfação – do fracasso de Mike, estavam se preparando para agir.
Eric já estava pronto, encostado na picape dela, de modo que ela não conseguisse evitá-lo. A aula de Tyler estava atrasada por causa de um trabalho, e ele estava desesperado para pegá-la antes que ela escapasse.
Isso eu tinha que ver.
– Espere pelos outros aqui, está bem? – murmurei para Emmett.
Ele me olhou, suspeito, mas então deu de ombros e acenou.
O garoto ficou louco, ele pensou, divertido com meu pedido esquisito.
Eu vi a Bella saindo do ginásio, e esperei ela passar de um lugar onde ela não me veria. Quando ela se aproximou da emboscada de Eric, eu fui para mais perto, andando num ritmo que me faria passar no momento certo.
Eu observei o corpo dela ficar tenso quando viu o garoto a esperando. Ela parou por um momento, então relaxou e continuou andando.
– Oi, Eric. – eu a escutei falar num tom amigável.
Fiquei inesperadamente ansioso. E se esse menino magro e com problemas de pele fosse de algum modo atraente para ela?
Eric engoliu alto, seu pomo-de-adão tremendo. – Oi, Bella.
Ela parecia inconsciente do nervosismo dele.
– E aí? – ela perguntou, destrancando a picape sem olhar para a expressão assustada que ele tinha.
-É… só estava pensando… se você gostaria de ir ao baile de primavera comigo. – a voz dele tremeu.
– Pensei que as meninas é quem deviam convidar. – ela disse, parecendo frustrada.
– Bom, e é. – ele concordou infeliz.
Esse pobre menino não me irritou tanto quanto Mike Newton, mas eu não conseguia achar dentro de mim qualquer simpatia por sua angústia até que Bella lhe respondeu com uma voz gentil.
– Obrigada por me convidar, mas vou a Seattle nesse dia.
Ele já tinha ouvido isso; mesmo assim, ficou desapontado.
-Ah – ele murmurou. – Bom, quem sabe na próxima?
– Claro. – ela concordou. Então mordeu o lábio, como se tivesse se arrependido de dar uma brecha a ele. Gostei disso.
Eric se afastou da picape e foi embora, indo na direção errada para seu carro, querendo só escapar dali.
Passei por ela nesse momento, e escutei seu suspiro de alívio. Dei risada.
Ela se virou ao som, mas eu olhei para frente, tentando evitar que meus lábios se contorcessem em divertimento.
Tyler estava atrás de mim, quase correndo na pressa de falar com ela antes que ela pudesse ir para casa. Ele estava mais destemido e confiante que os outros dois; só tinha esperado tanto tempo para abordar Bella porque respeitava que Mike a tinha visto primeiro.
Queria que ele conseguisse falar com ela por dois motivos. Se – eu estava começando a suspeitar – toda essa atenção fosse irritante para Bella, eu queria aproveitar e assistir sua reação. Mas, se não – se o convite de Tyler fosse o que ela estava esperando – então eu queria saber disso também.
Medi Tyler Crowley como um rival, sabendo que isso era errado de se fazer. Ele parecia tediosamente comum e pouco notável para mim, mas o que eu sabia das preferências de Bella? Talvez ela gostasse de garotos comuns…
Estremeci com esse pensamento. Eu jamais conseguiria ser um garoto comum. Que tolice era me colocar como rival de seus afetos. Como ela poderia se importar com alguém que era, sob qualquer ângulo, um monstro?
Ela era boa demais para um monstro.
Eu devia deixá-la escapar, mas minha curiosidade indesculpável evitou que fizesse a coisa certa. De novo. Coloquei meu Volvo na pista estreita, bloqueando a saída dela.
Emmett e os outros estavam vindo, mas ele tinha descrito meu comportamento estranho para eles, então estavam andando lentamente, me observando, tentando entender o que eu estava fazendo.
Eu olhei a garota pelo retrovisor. Ela olhou meu carro com raiva, encontrando meu olhar, como se quisesse estar dirigindo um tanque do que uma picape Chevy enferrujada.
Tyler correu para o seu carro e entrou na fila atrás dela, agradecendo meu comportamento inexplicável. Ele acenou para ela, para chamar sua atenção, mas ela não notou. Ele esperou um momento, então saiu do carro, vagando para a janela do carona dela. Bateu no vidro.
Ela pulou, então olhou para ele confusa. Depois de um segundo, abriu as janelas manualmente, parecendo ter alguns problemas com elas.
– Desculpe, Tyler. – ela disse numa voz irritada. – Estou presa atrás do Cullen.
Ela falou meu sobrenome com uma voz dura – ainda estava brava comigo.
– Ah, eu sei – Tyler disse, não se importando com o humor dela. – Eu só queria perguntar uma coisa enquanto estamos atolados aqui.
O sorriso dele era convencido.
Fiquei aliviado com o jeito que ela empalideceu com a tentativa óbvia dele.
– Vai me convidar para o baile de primavera? – ele perguntou, nenhum pensamento de derrota em sua mente.
– Eu não estarei na cidade, Tyler. – ela lhe disse, a irritação ainda bem presente em sua voz.
-É, o Mike me contou.
– Então por quê… – ela começou a perguntar.
Ele deu de ombros. – Eu esperava que você só estivesse se livrando deles do jeito mais fácil.
Os olhos dela queimaram, então ficaram frios. – Desculpe, Tyler. – ela disse, sem parecer sentir nada. – Eu estarei mesmo fora da cidade.
Ele aceitou essa desculpa, sua autoconfiança intocada. – Tudo bem. Ainda temos o baile dos estudantes.
Ele se empertigou e foi para o seu carro.
Estava certo em ter esperado por isso.
A expressão horrorizada no rosto dela era impagável. Disse-me o que eu não devia estar tão desesperado para saber – que ela não sentia nada por nenhum desses garotos humanos que queriam convidá-la.
E também, a expressão dela era possivelmente a coisa mais engraçada que eu já tinha visto.
Minha família chegou então, confusa pelo fato de que eu estava, para variar, me tremendo com o riso em vez de fazendo uma careta assassina a qualquer coisa à vista.
O que é tão engraçado? Emmett quis saber.
Eu só balancei minha cabeça enquanto me revirei com uma nova onda de riso quando Bella acelerou seu motor nervosa. Ela parecia querer o tanque outra vez.
– Vamos embora! – Rosalie sibilou impaciente. – Pára de ser idiota. Se puder.
As palavras dela não me irritaram – estava muito distraído. Mas fiz o que ela pediu.
Ninguém falou comigo no caminho para casa. Continuei a rir uma vez ou outra, pensando no rosto de Bella.
Quando eu virei para a estrada – acelerando agora que não havia testemunhas – Alice arruinou meu humor.
– Então eu posso falar com a Bella agora? – ela perguntou inesperadamente, sem considerar as palavras primeiro, não me dando aviso.
– Não. – eu revidei.
– Isso não é justo. Por que estou esperando?
– Eu ainda não decidi nada, Alice.
– Que seja, Edward.
Na cabeça dela, os dois destinos de Bella estavam claros novamente.
– Qual o sentido em conhecê-la? – eu murmurei, de repente rabugento. – Se eu vou matá-la?
Alice hesitou por um segundo. – Você tem razão. – ela admitiu.
Virei a ultima curva a 150 km/h então parei a três centímetros da parede da garagem.
– Aproveite sua corrida. – Rosalie disse presunçosa quando eu me atirei para fora do carro.
Mas eu não fui correr hoje. Em vez disso, fui caçar.
Os outros iriam caçar amanhã, mas eu não podia estar com sede agora. Exagerei, bebendo mais do que o necessário, me fartando de novo – um pequeno grupo de cervos e um urso negro que tive a sorte de cruzar tão cedo no ano. Estava tão cheio que era desconfortável. Por que isso não podia ser o suficiente? Por que o cheiro dela tinha que ser tão mais forte que todas as outras coisas?
Eu tinha caçado para me preparar para o próximo dia, mas, quando eu não conseguia mais fazer isso e o sol ainda estava a horas de nascer, soube que o próximo dia não chegaria rápido o bastante.
A enorme tensão me varreu outra vez quando eu percebi que ia encontrar a garota.
Eu lutei comigo todo o caminho de volta a Forks, mas meu lado menos nobre ganhou a discussão, e eu segui adiante com meu plano indefensável. O monstro estava inquieto, mas bem alimentado. Eu sabia que manteria uma distância segura dela. Só queria saber como ela estava. Só queria ver seu rosto.
Passava da meia-noite e a casa de Bella estava escura e silenciosa. A picape dela estacionada no meio-fio e a radiopatrulha de seu pai na entrada de carros. Não havia pensamentos conscientes em lugar algum na vizinhança. Olhei a casa por um momento, da escuridão da floresta me a cercava do lado leste. A porta da frente provavelmente estava trancada – não que isso fosse um problema, exceto que eu não queria deixar a porta quebrada como evidência para trás. Decidi tentar a janela de cima primeiro. Não existiam muitas pessoas que se importavam em instalar uma fechadura ali.
Cruzei o jardim aberto e escalei a parede da casa em meio segundo. Pendurado por uma mão na calha que ficava em cima da janela, olhei pelo vidro, e minha respiração parou.
Era o quarto dela. Eu a conseguia ver, as cobertas no chão e os lençóis enrolados por suas pernas. Enquanto eu olhava, ela se virou inquieta e colocou um braço por cima da cabeça. Ela não dormia profundamente, pelo menos não à noite. Ela sentiu o perigo próximo?
Fiquei com nojo de mim mesmo quando a vi mexer de novo. O quanto eu era melhor que qualquer outro bisbilhoteiro? Eu não era melhor. Era muito, muito pior.
Relaxei as pontas dos meus dedos, para me deixar cair. Mas primeiro me permiti um longo olhar para o rosto dela.
Não estava tranqüilo. A pequena ruga estava entre suas sobrancelhas, os cantos de seus lábios para baixo. Seus lábios tremeram, e então se abriram.
– Está bem, mãe. – ela resmungou.
Bella falava dormindo.
A curiosidade me invadiu, mais forte que o nojo que tinha por mim mesmo. O encanto que aqueles pensamentos falados, desprotegidos e inconscientes, era incrivelmente tentador.
Eu tentei abrir a janela, e não estava fechada, embora tenha travado por ter ficado tanto tempo sem ser aberta. Eu a empurrei lentamente para o lado, encolhendo a cada pequeno gemido que a moldura de metal fazia. Teria que achar algum óleo para a próxima vez…
Próxima vez? Eu balancei a cabeça, com nojo de novo.
Passei silenciosamente pela janela meio aberta.
O quarto dela era pequeno – desorganizado, mas não sujo. Havia livros empilhados no chão perto da sua cama, suas lombadas viradas para o outro lado, e CDs espalhados perto de seu disc-man barato – o que estava por cima era só uma caixa vazia. Papéis cercavam um computador que parecia mais pertencer a um museu dedicado a tecnologias obsoletas. Sapatos estavam no chão de madeira.
Eu queria muito ler os títulos de seus livros e CDs, mas tinha prometido que iria manter a distância; em vez disso, fui sentar na velha cadeira de balanço no outro canto do quarto.
Alguma vez eu tinha realmente pensado que ela era comum? Pensei naquele primeiro dia, e meu nojo pelos garotos que ficaram tão rapidamente intrigados por ela. Mas quando eu me lembrei do rosto dela nos pensamentos deles, não conseguia entender por que não a tinha achado linda imediatamente. Parecia uma coisa óbvia.
Nesse momento – com seu cabelo escuro embaraçado e selvagem envolta de seu rosto pálido, usando uma camiseta puída cheia de buracos e uma calça surrada – ela me deixou sem fôlego. Ou teria, pensei ironicamente, se eu estivesse respirando.
Ela não falou. Talvez seu sonho tenha terminado.
Eu encarei seu rosto e tentei pensar em algum modo de deixar o futuro suportável.
Machucá-la não era suportável. Isso significava que minha única escolha era tentar ir embora novamente?
Os outros não podiam discutir comigo agora. Minha ausência não iria colocar ninguém em perigo. Não teria nenhuma suspeita, nada para levar os pensamentos de ninguém de volta ao acidente.
Eu vacilei como tinha feito esta tarde, e nada pareceu possível.
Não podia esperar ser rival dos meninos humanos, quer esses garotos específicos a atraíssem ou não. Eu era um monstro. Como ela podia me ver de qualquer outro jeito? Se ela soubesse a verdade sobre mim, iria assustá-la e repulsá-la. Como a vítima em um filme de terror, ela iria correr, gritando de horror.
Lembrei-me do primeiro dia dela na aula de biologia… e soube que essa seria exatamente a reação certa para ela ter.
Era besteira imaginar que se fosse eu quem tivesse a convidado para esse baile bobo, ela teria cancelado seus planos feitos em cima da hora e concordado em ir comigo.
Não era a mim que ela estava destinada a dizer sim. Era para alguma outra pessoa, humana e quente. E eu nem podia – algum dia, quando ela dissesse sim – me deixar caçá-lo e matá-lo, porque ela o merecia, quem quer que fosse que tivesse escolhido.
Eu devia a ela fazer a coisa certa agora; não podia mais fingir que estava só em perigo de amar essa garota.
E mesmo assim, não importava realmente se eu fosse embora, porque Bella jamais me veria do jeito que eu queria que ela visse. Ela nunca me veria como alguém que merecesse ser amado.
Nunca.
Um coração morto, gelado, podia ser despedaçado? Parecia que o meu podia.
– Edward. – Bella disse.
Eu congelei, encarando seus olhos fechados.
Ela tinha acordado, me visto aqui? Ela parecia adormecida, mas sua voz tinha sido tão clara…
Ela suspirou calmamente, então se moveu inquieta outra vez, rolando de lado – ainda dormindo e sonhando.
– Edward. – ela murmurou suavemente.
Ela estava sonhando comigo.
Um coração morto, gelado, podia bater de novo? Parecia que o meu podia.
– Fique. – ela suspirou. – Não vá. Por favor… não vá.
Ela estava sonhando comigo, e nem era um pesadelo. Ela queria que eu ficasse com ela, lá em seu sonho.
Eu lutei para achar palavras para nomear os sentimentos que me invadiram, mas não existiam palavras fortes o suficiente para descrevê-los. Por um longo momento, me afoguei neles.
Quando eu emergi, não era o mesmo homem que havia sido.
Minha vida era a meia-noite, sem mudanças, sem fim. Deveria, por necessidade, sempre ser a meia-noite para mim. Então como era possível que o sol estivesse nascendo agora, bem na metade da meia-noite?
No momento em que me tornei um vampiro, trocando minha alma e mortalidade por imortalidade na dor abrasadora da transformação, eu tinha realmente congelado. Meu corpo tinha se transformado em algo mais para pedra do que para carne, permanente e sem mudanças. Eu mesmo, também, tinha congelado como era – minha personalidade, meus gostos e desgostos, meus humores e meus desejos; todos fixados de um jeito.
Era a mesma coisa para o resto dele. Todos nós estávamos congelados. Pedras vivas.
Quando uma mudança chegava para um de nós, era uma coisa rara e inalterável. Tinha visto acontecer com Carlisle, e uma década depois, com Rosalie. O amor os tinha mudado de um jeito irremediável, um jeito que nunca mais mudava. Mais de oitenta anos haviam se passado desde que Carlisle achara Esme, e ele ainda a olhava com os olhos incrédulos de primeiro amor. Seria sempre assim para eles.
Seria sempre assim para mim também. Eu sempre amaria essa frágil garota humana, pelo resto da minha existência sem limites.
Olhei para seu rosto inconsciente, sentindo esse amor por ela se acomodar em cada célula do meu corpo de pedra.
Ela dormia com mais calma agora, um sorriso fraco em seus lábios.
Sem deixar de observá-la, comecei a planejar.
Eu a amava, então eu tentaria ser forte o suficiente para deixá-la. Eu sabia que não era forte assim agora. Teria que trabalhar nisso. Mas talvez eu fosse forte o suficiente para moldar o futuro de outro jeito.
Alice tinha visto só dois futuros para Bella, e agora eu entendia os dois.
Amá-la não evitaria que eu a matasse, se eu cometesse erros.
Mas eu não conseguia sentir o monstro agora, não conseguia achá-lo em nenhum lugar dentro de mim. Talvez o amor o tivesse silenciado para sempre. Se eu a matasse agora, não seria intencional, só um horrível acidente.
Eu teria que ser extraordinariamente cuidadoso. Jamais, jamais seria capaz de baixar a guarda. Teria que controlar cada respiração. Teria sempre que manter uma distância segura.
Não cometeria erros.
Eu finalmente entendi o segundo futuro. Tinha estado aterrorizado por essa visão – o que poderia acontecer que resultaria em Bella se tornar uma prisioneira nessa meia-vida imortal? Agora – devastado por desejar a garota – eu podia entender como eu, num egoísmo indesculpável, pediria a meu pai esse favor. Pediria a ele que tirasse a vida e a alma dela para que eu pudesse ficar com ela para sempre.
Ela merecia coisa melhor.
Mas eu vi mais um futuro, uma linha estreita pela qual eu talvez pudesse caminhar, se pudesse manter meu equilíbrio.
Conseguiria fazer? Ficar com ela e deixá-la humana?
Deliberadamente, inspirei fundo e depois outra vez, deixando que seu cheiro passasse por mim como fogo. O quarto estava cheio de seu perfume; a fragrância dela saía de cada superfície. Minha cabeça girou, mas lutei contra a tontura. Teria que acostumar com isso, se eu fosse tentar ter qualquer tipo de relacionamento com ela. Respirei novamente, deixando o ar me queimar.
A observei dormindo até que o sol nascesse atrás das nuvens no leste, planejando e respirando.
Fui para casa quando os outros tinham ido embora para a escola. Troquei de roupa rapidamente, evitando os olhos cheios de perguntas de Esme. Ela viu a luz febril em meu rosto, e sentiu preocupação e alívio. Minha melancolia sem fim a magoava, e ela estava feliz que parecia ter acabado.
Eu corri para a escola, chegando poucos segundos depois que meus irmãos. Eles não viraram, embora Alice deva ter desconfiado que eu estava parado aqui nas grossas árvores que cercavam o asfalto. Eu esperei até que ninguém estivesse olhando, e então andei casualmente por entre as árvores até o estacionamento cheio de carros.
Eu ouvi a picape de Bella rugindo na esquina, e parei atrás de um Suburban onde podia observá-la sem ser visto.
Ela dirigiu até o estacionamento, olhando meu Volvo por um longo momento antes de parar em uma das vagas mais distantes, uma careta em seu rosto.
Era estranho lembrar que ela provavelmente ainda estava brava comigo, e por um bom motivo.
Eu queria rir para mim mesmo – ou me chutar. Todo o meu esquema e planejamento eram totalmente inúteis se ela não se importasse comigo, não eram? O sonho dela pode ter sido sobre alguma outra coisa aleatória. Eu era mesmo um tolo arrogante.
Bom, era muito melhor para ela se não se importasse comigo. Isso não me impediria de persegui-la, mas eu a avisaria de minha perseguição. Devia isso a ela.
Andei silenciosamente, pensando qual seria a melhor forma de me aproximar dela.
Ela deixou fácil. A chave da picape escorregou por seus dedos quando ela saiu, e caiu em uma poça funda.
Ela se inclinou, mas eu cheguei antes, a pegando antes que ela tivesse que colocar os dedos na água fria.
Encostei-me na picape quando ela me encarou e então se endireitou.
– Como é que você fez isso? – ela perguntou.
Sim, ainda estava brava.
Oferecia a chave para ela. – Fiz o quê?
Ela esticou a mão, e eu a deixei cair em sua palma. Respirei fundo, absorvendo seu cheiro.
– Aparecer do nada desse jeito. – ela esclareceu.
– Bella, não é culpa minha se você é excepcionalmente distraída. – As palavras eram sarcásticas, quase uma piada. Tinha alguma coisa que ela não visse?
Ela ouviu como a minha voz disse o nome dela com carinho?
Ela me encarou, não gostando muito do meu humor. Os batimentos dela aceleraram – de raiva? De medo? Depois de um momento, ela olhou para baixo.
– Por que o engarrafamento de ontem? – ela perguntou sem encontrar meus olhos. – Pensei que você devia fingir que eu não existo e não me matar de irritação.
Ainda estava bastante brava. Ia tomar algum esforço para deixar as coisas certas com ela. E me lembrei da minha resolução de ser honesto com ela…
– Aquilo foi pelo Tyler e não por mim. Tive que dar uma chance a ele. – E então eu ri. Não podia evitar, pensando na expressão dela de ontem.
– Você… – ela engasgou, então parou, parecendo estar furiosa demais para terminar. Ali estava – a mesma expressão. Abafei outra risada. Ela já estava nervosa o suficiente.
– E não estou fingindo que você não existe. – terminei. Estava certo em manter as coisas casuais, em provocá-la. Ela não entenderia se eu a deixasse ver como me sentia de verdade. Iria assustá-la. Tinha que manter meus sentimentos sob controle, manter as coisas leves…
– Então está tentando mesmo me matar de irritação? Já que a van do Tyler não fez o serviço?
Um rápido lampejo de raiva passou por mim. Como ela podia honestamente acreditar nisso?
Era irracional da minha parte ficar tão ofendido – ela não sabia da transformação que tinha acontecido à noite passada. Mas a raiva era a mesma.
– Bella, você é completamente absurda. – eu revidei.
O rosto dela corou, e ela virou as costas para mim. Começou a ir embora.
Remorso. Não havia sentido em minha raiva.
– Espere. – eu pedi.
Ela não parou, então eu a segui.
– Desculpe, foi grosseria minha. Não estou dizendo que não é verdade. – era absurdo imaginar que eu a queria machucada em qualquer jeito. – mas de qualquer forma, foi uma grosseria dizer aquilo.
– Por que não me deixa em paz?
Acredite, eu quis dizer. Eu tentei.
Ah, outra coisa, estou miseravelmente apaixonado por você.
Mantenha a coisa leve.
– Quero perguntar uma coisa, mas você está me evitando. – Um outro curso de ação tinha me ocorrido e eu dei risada.
– Você tem distúrbio de personalidade múltipla? – ela perguntou.
Parecia que sim. Meu humor instável, tantas emoções novas passando por mim.
– Lá vem você de novo. – eu assinalei.
Ela suspirou. – Tudo bem, então. O que quer me perguntar?
– Eu estava me perguntando se, no sábado que vem… – observei o choque passar por seus olhos e sufoquei outra risada. – Sabe, no dia do baile de primavera…
Ela finalmente me interrompeu, voltando seus olhos para mim. – Está tentando ser engraçadinho?
Sim. – Quer, por favor, me deixar terminar?
Ela esperou em silêncio, os dentes mordendo o lábio macio inferior.
Essa visão me distraiu por um momento. Reações estranhas, desconhecidas agitaram fundo no meu interior humano. Tentei me livrar delas para que pudesse fazer meu papel.
– Eu a ouvi dizer que vai a Seattle nesse dia e estava pensando se você queria uma carona. – ofereci. Percebi que, melhor que perguntar a ela sobre seus planos, eu poderia partilhá-los.
Ela me olhou inexpressivamente. – Como é?
– Quer uma carona para Seattle? – Sozinho no carro com ela – minha garganta queimou com o pensamento. Respirei fundo. Se acostume.
– Com quem? – ela perguntou, seus olhos arregalados e confusos de novo.
– Comigo, é claro. – eu disse lentamente.
– Por quê?
Era realmente um choque que eu queria a companhia dela? Ela deve ter chegado a pior conclusão possível com meu comportamento passado.
– Bom, eu pretendia ir a Seattle nas próximas semanas e, para ser sincero, não tenho certeza se sua picape vai agüentar. – Era mais seguro provocá-la do que me permitir ser sério.
– Minha picape funciona muito bem, obrigada por sua preocupação. – ela disse na mesma voz surpresa. E começou a andar outra vez. Continuei a seguindo.
Ela não havia dito não, então pressionei essa vantagem.
Ela diria não? O que eu faria se ela dissesse?
– Mas sua picape pode chegar lá com um tanque de gasolina?
– Não vejo como isso pode ser da sua conta. – ela reclamou.
Ainda não era um não. E o coração dela estava batendo mais rápido de novo, a respiração vindo mais rápida.
– O desperdício de recursos não-renováveis é da conta de todos.
“Honestamente, Edward, eu não consigo te acompanhar. Eu pensei que você não queria ser meu amigo.”
Uma forte emoção me atravessou quando ela disse meu nome.
Como manter isso suave e também ser honesto ao mesmo tempo? Bem, era mais importante ser honesto. Especialmente nesta questão.
“Eu disse que seria melhor se não fossemos amigos, não que eu não queria ser.”
“Oh, obrigada, isso esclarece tudo,” ela disse sarcasticamente.
Ela pausou, sob o teto da cafeteria, e encontrou meu olhar novamente. As batidas de seu coração estavam vacilantes. Ela estava com medo?
Eu escolhi minhas palavras cuidadosamente. Não, eu não poderia deixá-la, mas talvez ela fosse esperta o suficiente para me deixar, antes que fosse muito tarde.
“Seria mais… prudente pra você não ser minha amiga.” Fitando a profundeza de chocolate derretido dos seus olhos, eu perdi minha segurança na luz. “Mas eu estou cansado de tentar ficar longe de você, Bella.” As palavras queimaram com muito fervor.
Sua respiração parou e, quando voltou a respirar, aquilo me preocupou. Quanto eu a tinha assustado? Bem, eu descobriria isso.
“Você vai a Seattle comigo?” eu perguntei a queima roupa.
Ela acenou, seu coração batendo mais alto.
Sim. Ela tinha dito sim pra mim.
E depois minha consciência me sufocou. O que isso custaria a ela?
“Você realmente devia ficar longe de mim,” eu a alertei. Ela me ouviria? Ela escaparia do futuro no qual eu a estava lançando? Eu não poderia fazer nada para salvá-la de mim?
Mantenha-se suave, eu me adverti. “Te vejo na aula.”
Eu tive que me concentrar para me impedir de correr enquanto eu fugia.